JB Xavier

Uma viagem ao mundo mágico das artes!  A journey into the magical world of  the arts!

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WAGNER E NIETZSCHE – A POLÊMICA CONTINUA! – Parte 04 de 07 partes
WAGNER E NIETZSCHE – A POLÊMICA CONTINUA! – Parte 04 de 07 partes

J.B.Xavier

Bem vindos ao mundo da música e da filosofia. Este ensaio compõe-se de 07 partes, publicadas semanalmente.

Para quem está chegando agora:
Contemporâneas, essas duas mentes prodigiosas estiveram intimamente associadas por algum tempo, ligadas, como não poderia deixar de ser, pelas idéias grandiosas que ambas produziam.
Ao contrário de Nietzsche, Wagner era – e se considerava - um fim em si mesmo. Não se deixava influenciar por nada que não fosse monumental, especialmente no terreno musical. Sua personalidade marcante era de tal forma carismática que Nietzsche sucumbiu a ela e deixou-se apaixonar por suas idéias, para mais tarde, delas discordar e dar início à mais longa polêmica de que se tem notícia na história do pensamento humano!

* * *

PARTE IV

No capítulo anterior vimos que a polivalência do talento de Richard Wagner dificulta a classificação de seu gênio. Neste, veremos mais sobre esse caleidoscópio de talentos e porque Nietzsche tentou esfacelá-lo.

Para que se tenha uma idéia da originalidade do talento de Wagner, lembro que o gigante da ópera alemã não conseguia escrever música operística sobre libretos de outrem, sendo necessário que ele mesmo os escrevesse. Não poderia ter feito coisa mais certa, pois seus enredos sobre a mitologia alemã são simplesmente de tirar o fôlego!

Isto se devia ao fato de Wagner ser também um escritor, cuja capacidade de engendrar enredos só era superada pela capacidade que tinha de lhes fornecer dramaticidade através da música. Nenhum libreto que lhe ofereciam para musicar lhe parecia suficientemente consistente para merecer a beleza dos acordes que lhe inundavam o cérebro. Assim, ele mesmo escrevia seus enredos – obviamente com temas nórdicos que evocasse a origem do povo alemão.

Ao compor sobre temas deísticos nórdicos, Wagner estava, sem o saber, lançando no ar o feitiço cujo perfume um dia viria a ser aspirado por Nietzsche.

Isto porque ao evocar os seres da mitologia nórdica, Wagner não se aproximava dos temas cristãos, tão em voga na época pelos compositores que desejassem elevar seu conceito junto às classes dominantes, tanto da Igreja Católia quando dos luteranos.

Nietzsche, por seu lado, cedo abriu fogo pesado contra o cristianismo, como veremos mais adiante. Agradava-o mais a doutrina de Ário (250-336), padre cristão de Alexandria (Egito) que afirmava ser Cristo a essência intermediária entre a divindade e a humanidade, mas negava-lhe o caráter divino e ainda desacreditava a Santíssima Trindade.

Perfeito! Era tudo o que o filósofo precisava para apoiar suas teses: Um compositor alemão que não se deixava seduzir pelo cristianismo – aliás, nem por coisa alguma da ordem estética estabelecida. Numa palavra: Um revolucionário!            

Mas, voltemos a Wagner. Nietzsche surgiu muito mais tarde na vida do compopsitor.

Admirador de Weber, Mozart e Beethoven, o jovem Wagner, que procedia de uma família de comediantes, e que por força da própria profissão, levava uma vida aventurosa, cedo percebeu que a Alemanha não tinha uma linguagem musical teatral própria, e que, o que existia, era o modelo italiano, como aliás, no resto da Europa.

O que Wagner fez pela ópera alemã só encontra paralelo no que fez Verdi pela italiana. Entretanto, é preciso que se compreenda que a mesocracia da época, tinha na ópera seu porta voz, o que faria com que esse gênero musical adquirisse uma forte influência nacionalista.

Se Meyerbier, que com sua pompa fazia a “Grand’ópera” denunciando a decadência da França; Wagner, a exemplo de Verdi, pretendia criar a ópera alemã com sentimento alemão! Queria que ela fosse sentida, compreendida e degustada pelo povo alemão, e os exemplos disso são TRISTÃO E ISOLDA, LOHENGRIN e OS MESTRES CANTORES.

É necessário, portanto, que se visualize Wagner em seu tempo, e, de lá, olhar para o futuro, séculos à frente! Mas isso é coisa difícil de fazer, devido à extemporaneidade de sua obra. É preciso vê-lo num contato estreito com o teatro, com o palco, e vivendo um nacionalismo exaltado. Se não for assim, a ótica fica distorcida e será ainda mais difícil entender sua personalidade.

Aí reside dois dos mais freqüentes erros cometidos pelos analistas wagnerianos: Ou eles tentam pensar Wagner aprisionando-o em seu tempo, ou tentam pensá-lo com o raciocínio moderno e atual.

Nenhum dos dois procedimentos abrange Wagner completamente, porque em muitos aspectos, sua maneira de pensar ainda está no futuro, mesmo para nós, passageiros do século XXI, que estamos prestes a pousar em marte!

Muitas de suas frases musicais ainda soam hereges para os cânones da música. Certamente porque ainda não compreendemos completamente sua arte, prisioneiros que somos dos padrões estéticos a nós impostos.

Já foi dito que a maior liberdade a que uma pessoa pode aspirar é decidir em que tipo de cadeia irá viver. Não era o caso de Wagner! Ele chutou para o alto as convenções e criou um paraíso musical de liberdade até então absolutamente impensável, e lá instalou-se – no início, só, e depois, com os milhões de adeptos que sua música fez pelo mundo.    

O palco emprestou a Wagner seus modos histriônicos, e sua linguagem e talentos incomodavam a todos quantos se sentissem ensombrecidos por sua figura. As críticas desciam a pormenores acabrunhantes:

Não era Wagner aquele músico coberto de dívidas, que a todos pedia ajuda, sem que pudesse ao menos apresentar as garantias de rendimentos regulares? Não era esse mesmo pedinte que aparentava um “status” que nunca possuíra, e que tinha o guarda-roupas lotado com mais de vinte roupões de seda?

Era esse mesmo, sim senhores! E mais! Quando pedia à sua criada os tecidos, faixas e perfumes que costumeiramente usava, portava-os com todo o luxo dos pormenores.

Richard Wagner sentia-se chamado para uma missão titânica. Modificar, ou ainda, instituir uma nova ordem  de valores no teatro musical alemão! Por essa ousadia, foi acusado por Nietzsche – e ainda o é atualmente pelos críticos musicais de plantão – de introduzir em sua obra, muito do seu cotidiano. Nietzsche, no limite da acidez contra Wagner, disse  que ele fazia, em suas criações, um espelho de si mesmo.

Por uma questão de compromisso com a verdade, é necessário que eu diga que não houve um só escrito sobre Wagner por mim pesquisado - especialmente nos originais alemães, cuja acridez as traduções não diluíram - onde não conste que a própria vida do compositor foi uma constante representação.

Nem poderia ser diferente, eu diria, porque a verdade é que seus valores morais foram moldados pelos valores morais volúveis do teatro. Mas, felizmente para o mundo, Wagner não era volúvel ao ponto de esquecer sua fidelidade aos seus ideais. Na verdade, seus ideais eram tudo o que lhe importava, e graças a essa fidelidade, é-nos possível hoje, ouvir os maravilhosos acordes de sua música acrobática.

Um dos maiores “crimes” de Wagner, foi, como Beethoven - aliás, inspirado nele – nunca ter se rendido à “tirania” branca dos ricos mecenas que haviam enclausurado a criatividade portentosa de outros gigantes da música, como Mozart, Haydn ou Bach. Só Deus sabe que outras maravilhosas partituras desses criadores estaríamos ouvindo hoje, se esses “benevolentes” mecenas tivessem deixado fluir o rio da criação desses músicos monumentais.

Mas esses poderosos “protetores”, em troca da segurança financeira que esses compositores buscavam e precisavam, fê-los criar obras que nada tinham a ver com suas naturezas, e assim, violentaram a força criadora desses grandes mestres, fazendo-os dedicar-lhes os frutos de seu gênio.

Nesse quesito – a liberdade de criação – Wagner foi muito além de Beethoven, que já havia ousado bastante - e abominou a aristocracia e as vaidades do alto clero, quando estes tentavam interferir em seu trabalho. Agradava-o mais os gigantes da interpretação, Lizt e Paganini. Ambos foram os maiores intérpretes que o mundo já conheceu, em seus instrumentos, respectivamente, piano e violino. Admirava-os por terem conseguido libertar-se da escravidão das algemas sociais e financeiras.

Se vivesse nos dias de hoje, Wagner seria o “rebelde com causa”. Uma espécie de Jimmy Hendrix do séc XIX ao contrário! E assim como Eric Clapton pensou em parar de tocar ao ouvir pela primeira vez a gitarra ensandecida de Hendrix, num show em Londres, assim também Meyerbier roía as unhas ao ver a música wagneriana transbordar das parituras para uma região onde nenhum músico ousara ir até então.  

Obviamente, tal rebeldia numa arte tão valorizada no séc XIX, com princípios firmemente estabelecidos por magníficos compositores contemporâneos de Wagner, tinha um preço.

Wagner não inicou sua carreira dentros dos cânones estabelecidos, para depois, paulatinamente, dar a conhecer sua maturidade e ousadia musicais. Não! Ele tomou a sociedade de assalto, apresentando a ela sua arte revolucionária repentinamente! Como evento cultural e respectivas conseqüências sociais, este fenômeno só viria a se repetir um século mais tarde, com o advento do Rock’Rol, e mesmo assim, como fruto não de uma única mente prodigiosa, mas de um momento de globalização cultural.

Depois de Wagner, a música nunca mais seria a mesma, e talvez tenha sido ele a raiz do surgimento da música enigmática de Stravinsky e outros compositores modernos.

Para Nietzsche, tal mudança nos rumos da cultura alemã, capitaneada por um homem do teatro – ele abominava o teatro - não poderia passar em brancas nuvens. Era intolerável que um homem dos palcos, no espaço de uma vida apenas, ousasse tal feito!

Por seu lado, Wagner, por ter plena consciência de que não era um instrumentista excepcional, decidiu vencer pela composição, mas isso já é assunto para o próximo capítulo.

Até lá!!

* * *

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JB Xavier
Enviado por JB Xavier em 13/08/2005
Alterado em 08/03/2010


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